A mesa de Bangcoc deixa a calçada
Publicada em 27/12/2010 às 01h37m
Ceil Miller Bouchet, do New York Times
BANGCOC - Perguntei ao meu marido, que, arquejando e arfando, parecia estar tendo um ataque do coração: "Você consegue respirar?". Eu não estava muito melhor. Lágrimas corriam pelas minhas bochechas enquanto eu usava o nosso cardápio para produzir uma brisa a partir do ar opressivo no Bo.lan, um atraente e ambicioso restaurante de Bangcoc. A comida estava muito picante. Mas eu não poderia resistir a experimentar mais. Engoli uma porção de arroz e esperei um pouco.
Uma infusão adocicada de coco abriu caminho para um sabor ardido, de uma forma similar a uma lenta subida em uma montanha-russa, antes da descida final. Mas quando mordi a massa pastosa, eu soube para quê havia sido feito aquilo. O calor de pimentas esmagadas correu por minha boca, bochechas, olhos, couro cabeludo e pele, em uma onda de fogo deliciosa. E isso era apenas um aperitivo.
Sobreviveria eu, com meu paladar de farang (ocidental, em tailandês), a uma refeição de um dos mais picantes restaurantes de Bangcoc? Havia mais a seguir: o Bo.lan foi apenas um da lista de lugares que eu planejava visitar em minha busca por casas onde cozinheiros e chefs estão promovendo a comida thai e sua grande variedade de sabores.
Por anos, outras cozinhas - italiana, francesa, japonesa - dominaram a cena gastronômica de alta qualidade em Bangcoc. Para uma verdadeira experiência com comida thai, você teria de trocar as toalhas de mesa por tamboretes de plástico em uma das tendas nas calçadas. Mas no fim dos anos 1980, um jovem chef, o australiano David Thompson, aterrissou na Tailândia com uma missão: fazer a cozinha thai ser promovida, em outros países, de fast food para alta gastronomia. Ele aprendeu tudo o que podia, escreveu dois livros de receitas e inspirou uma turma de jovens chefs no seu restaurante com estrelas Michelin em Londres, o Nahm, aberto em 2001. E em seu movimento mais ousado, Thompson voltou recentemente a Bangcoc, para abrir uma filial do Nahm.
Assim, com a ajuda de Thompson e de outros, abandonei as barracas nas calçadas para conhecer novos restaurantes, mercados, praças de alimentação de shoppings e restaurantes mais básicos onde se destacam sabores tradicionais em locais mais confortáveis.
BO.LAN
Com apenas um ano de existência, o Bo.lan (o nome é uma versão da palavra tailandesa para "ancião" e ao mesmo tempo, a contração dos apelidos dos dois chefs e proprietários do estabelecimento) é talvez o primeiro restaurante chique de Bangcoc com foco na slow food sustentável, com produtos orgânicos e da estação. Até o nosso aperitivo, uma taça de champanhe com tons de âmbar do ya dong - uma infusão apimentada à base de arroz , tradicionalmente servida a trabalhadores braçais em jarras de vidro nas calçadas da cidade - era feita artesanalmente.
Logo que chegamos, nosso menu degustação da estação começou a ser servido, iniciando-se com o escaldante mas saboroso aperitivo. Fomos então para a frigideira de mangostão selvagem azedo, leitão e pasta doce de camarão. Ela foi seguida por uma prancha cheia de arroz fermentado no creme de coco, rodeada por flores de abóbora amassadas e fritas, e folhas de tangerina picantes. Meu favorito, no entanto, foi um rico curry vermelho com noz-moscada e carne de vaca, um prato típico do Sul do país, predominantemente muçulmano. Nossa garçonete nos disse que as variedades do arroz perfumado e suave que foram servidos eram colhidas à mão no Norte da Tailândia.
- Por favor, guardem lugar para a sobremesa - murmurou ela, para em seguida acrescentar, com a típica moderação tailandesa - os doces são muito bons.
Ela estava certa. Dois doces gelados - incluindo um picolé com essência de folhas de palmeira, um sabor encontrado frequentemente em sobremesas do Sudeste Asiático - definitivamente tiraram qualquer traço restante do ardor dos primeiros pratos. Terminada nossa refeição, degustei um doce de arroz e meu marido escolheu um pote de creme de coco caramelado.
Bo.lan: O menu de sete pratos custa 1.500 baht, ou US$ 50, por pessoa, sem contar bebidas e gorjeta. 42 Soi Sukhumvit 26, Klongtan Klongteoy. Tel. (66-2) 260-2962. www.bolan.co.th
MERCADO OR TOR KOR
Em frente ao Chatuchak, o mercado de Bangcoc que funciona nos fins de semana - um úmido ajuntamento de lojas adorado pelos turistas - fica este mercado que abre diariamente e é frequentado pelos chefs de Bangcoc. É um grande lugar para aprender sobre a cozinha thai, e também para lanches. Numa manhã de sexta-feira (os dias úteis são os melhores), fui lá com o desbravador Thompson, que organizou uma expedição de compras com dois de seus jovens ajudantes do Nahm.
- Os produtos aqui são mais aromáticos do que em outros lugares, e os vendedores, mais escrupulosos sobre as origens deles - disse Thompson, enquanto entrávamos em uma área do tamanho de um campo de futebol cheia de luzes de néon.
- Você pode sentir o cheiro? - perguntou Thompson, enquanto nos aproximávamos de peixes fermentados. Ele pegou uma porção de galangal (planta da família do gengibre) rosa-claro e de noz-moscada fresca e dourada, ingredientes usados na salada de camarões. Perto de uma barraca de camarões secos, observamos um solitário estrangeiro segurando uma prancheta. Era um dos chefs do Bo.lan, Dylan Jones, buscando os ingredientes de sua lista de compras.
Enquanto eu passava pela seção de pasta de curry e alcançava a praça de alimentação, onde a música pop tailandesa ressoava e mesas conjuntas estavam cheias, provei caldo de cana gelado, almôndegas de carne de porco, uma omelete fina recheada e um pedaço de durião, uma fruta típica do Sudeste asiático. Pálida e melada, a fruta malcheirosa tinha gosto de foie gras de abacaxi.
Mercado Or Tor Kor: Esquina das ruas Pahonyothin e Kamphaeng.
CAFE CHILLI
Este lustroso café, em uma esquina tranquila e com ar-condicionado do Siam Paragon Mall, é um dos vários estabelecimentos (outros são o Somtum Bangkok e a Somtam Nua) que estão promovendo a rústica cozinha de Isaan, no nordeste da Tailândia. Clientes sofisticados almoçavam quando nós adentramos ao meio-dia, cansados da nossa manhã de compras no mercado Chatuchak. Fiquei aliviada ao ver os menus bilíngues e encantada com o serviço eficiente, especialmente levando em conta que nós não estávamos enfeitados como os outros fregueses, com minissaias diáfanas e salto alto ou camisetas coladas e relógios caros.
Nossa refeição começou com o som tam, uma salada islâmica clássica feita de mamão verde picado. Minha companhia explicou como ele balanceia os principais sabores da cozinha thai: o salgado (molho de peixe), o azedo (suco de limão), o ardente (chili) e o doce (um punhado de açúcar).
Em seguida, vieram nacos de frango marinados com molho picante e alho, gengibre e chili, seguido pelo larb, uma mistura fria de picadinho de porco, arroz com nozes moídas, ervas frescas picadas, suco de limão e pimentas tostadas servida com vegetais frescos e crus. Para mim, no entanto, o arroz roubou a cena. Verde, branco ou púrpura, estava tão longe do Uncle Ben's quanto Bangcoc é de Boston.
Cafe Chilli: Almoço para dois por 600 baht (US$ 20). Siam Paragon 991, rua Rama 1, Pathumwan. Tel. (66-2) 610-9877-8. www.cafechilli.com
KRUA APSORN

Li que Krua Apsorn (Cozinha de Apsorn) era um favorito da família real tailandesa. Mas o motorista do nosso tuk-tuk, como são chamados na Tailândia os pequenos táxis de três rodas que lembram um riquixá, passou pelo despretensioso restaurante, em uma rua engarrafada perto do Monumento a Democracia, duas vezes, antes de parar (um conselho: tenha os telefones dos restaurantes à mão).
Quando finalmente chegamos, ficou logo evidente que os reis não eram os únicos fãs. Todas as mesas de fórmica estavam tomadas por funcionários de escritórios aproveitando o ar-condicionado com o almoço. Conseguimos um lugar no pátio, onde um tanque enfeitava a varanda acima e o pessoal da cozinha lavava pratos em uma pia ao ar livre. Bem diferente da elegância do Bo.lan - mas a comida era igualmente cheia de nuances.
Thompson e o dono recomendaram que pedíssemos o especial da Apsorn: carne de caranguejo com curry em pó e curry amarelo ao estilo do Sudeste com camarão de água doce e brotos de lótus. Era a doce carne de caranguejo, banhada em um dourado molho de cúrcuma, acompanhado de pimentas vermelhas brilhantes e pedaços de cebola? Ou os sabores apimentados e salgados perfeitamente balanceados dos brotos de lótus, que pareciam aspargos no curry amarelo? Talvez fossem as garçonetes amigáveis, com seus lenços típicos, sorrindo das nossas interjeições de satisfação. Em todo caso, nós quase lambemos nossos pratos. Cobertos por uma concha de sorbet de coco caseiro, a tradicional refeição thai no Krua Apsorn, como se diz nos guias Michelins, "vale a viagem" - até a distante Bangcoc.
Krua Apsorn: Almoço para dois por 450 bahts (US$ 15), sem contar bebida e gorjetas. 169 Dinso, Phra Nakorn. Tel. (66-2) 685-4531. www.kruaapsorn.com
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